Uma nova chance
- Lorenzo Franchi
- 14 de mar. de 2017
- 2 min de leitura

Seis meses. Este foi meu período de aprendizado no Grupo RBS/ Diário de Santa Maria. Por este tempo adquiri conhecimento, estofo e experiência.
Em uma das minhas últimas semanas, como de costume, fui atender um cidadão na recepção da entidade. Ouvir reclamações, problemas eram rotina. Mudava o tema, mas não o discurso. Não culpo as pessoas, os problemas de fato existem, e nós (como mídia) devemos cobrar por melhorias.
Peguei meu bloquinho. Atravessei a redação e os corredores. Por trás das portas escuras de vidro estava um senhor calmo, despojado, com vestes claras e apenas a chave do carro em mãos. Apresentei-me. Perguntei seu nome:
- “Sílvio”.
- O que traz o senhor aqui, seu Sílvio? Alguma reclamação? Problema?
- Pelo contrário, meu jovem. Vim agradecer.
- Agradecer!?
- Isso! Quero agradecer o atendimento que tive em um posto de saúde da cidade. Se não fosse eles teria morrido. Passei o Natal mais emocionante da minha vida internado naquela unidade. Posso? Né!?, (disse ele empolgado).
Curioso, perguntei sua idade e o que o levara a UTI: “67 anos. Uma velha veia do coração me causando problemas” – (obstrução) falta de oxigênio.
Em minutos, a carta do leitor estava escrita- Dias mais tarde foi publicada, o que motivou uma série de outras cartas com elogios.
Eram quase 17h, de uma sexta-feira. Minhas páginas estavam desenhadas, não tinha pressa em ouvir (nunca tive, afinal não dispenso uma boa conversa). Estendi meu atendimento, de bom grado. Começamos a conversar sobre o clima, trânsito, até que ele se revelou um amante de Jazz.
O senhor risonho, que antes estava sentado, agora em pé, demonstrava, em gestos, suas peripécias nas noites. “Sílvio Caroço, esse é meu nome artístico. Todos amantes de boa música, que já tenham passado seus 50 anos me conhecem”, Ele dizia, sorrindo.
Uma história levava a outra. A boca estava virada em dentes. Até a dona Luíza, a zeladora da limpeza, se aprochegou para ouvir. “Fui músico. Amo Jazz/Blues. Sou o maior tocador de sax's que essa cidade já ouviu”, comentou.
Quando o papo é bom, o tempo voa. O relógio marcara 17h15min. Seu Sílvio precisava ir. Me deu um abraço, desejou-me um bom ano e saiu.
Ah, antes que me esqueça... Quando foi meia noite de Natal, todos os pacientes e enfermeiros da UTI "aplaudiram a vida", ou como ele falou, “ a nova chance”. No dia 28, ele recebeu alta e foi reencontrar o casal de filhos, os quais não os via há mais de anos, por motivo de brigas.
Segundo seu Sílvio, “todos nós devemos agradecer, pois a cada dia temos a oportunidade de recomeçar”. E, como disse o Rei do Blues, Miles Davis, “ A vida é como Jazz, pode improvisar, mas nunca perder o ritmo...Não se preocupe em tocar notas. Basta encontrar uma bonita (canção).
Ou seja, vamos VIVER. Todos temos problemas, mas há sempre muito mais a agradecer!
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