Sempre presente

Como é difícil escrever. Contar histórias não é uma tarefa nada fácil. As palavras que ganham sentido em linhas, as entonações, os porquês, tudo pesa, para quem está com a cabeça longe. Longe em pensamento, não do corpo, claro.

Estava atucanado. As ideias vinham, brotavam, mas como uma linda muda de flor se perdia. É tempo de seca, seca intelectual.

Com a mudança de rumo, passo a viver um sonho, que por breves minutos de medo se tornara angustia. Xerox, scan’s, cadastros. Estava cansado, louco para jogar tudo para o auto e fugir. Eis que me deparo com uma foto antiga dos tempos de criança. O velho casarão com paredes de barro, gastas pelo vento Minuano, as folhagens robustas, em tons verdes jamais vistos, foram moldura para que eu, meus dois irmãos, Nícolas e Luise, e minha prima, Ana Carolina, estivessem em destaque, sentados à frente com a estrela, minha avó, Beatriz.

Os olhos carregaram, a voz embargou. Sentei-me e comecei a pensar como seria se ela ainda estivesse viva. Nossa! Tudo seria diferente. Minha avó partiu cedo, cinquenta e poucos anos. Convivi menos ainda, é verdade, embora tenha assimilado algumas lições. O coração bom, puro, o amor pelos animais, à vontade em ajudar e o apego à família não são ao acaso. Não posso tirar dessa conta também o gosto por queijos.

Dona Beatriz era alta, um metro e oitenta e poucos, talvez. Mulherão. Forte como poucos homens, incrível como pessoa. Deixou inúmeras cicatrizes de saudade, mas o amor eterno por você é um sentimento que não se finda.

O real motivo que me levou a contar esta história, não foi a foto. Foi uma cadeirinha. Essas coloridas de plástico, baratas, simples, seu último presente. A minha foi quebrada por um amigo desastrado, pesado demais que se atreveu a repousar por ali. Mas, ainda está presente. A cadeira que um dia assentei, hoje descansa a saudade, mesmo no imaginário.

Eu sei que você ainda está aqui, vovó.

A única cadeira que sobrou, ou melhor, sobreviveu as estripulias da infância foi a da minha irmã, na foto a cima.